novembro 21, 2015

«Deus a falar contigo» - Espinosa

"Pára de rezar e de bater no peito! O que eu quero que faças é que saias pelo mundo e desfrutes de tua vida. Eu quero que gozes, cantes, te divirtas e que desfrutes de tudo o que Eu fiz para ti.
Pára de ir a esses templos lúgubres, obscuros e frios que tu mesmo construíste e que acreditas ser a minha casa. A minha casa está nas montanhas, nos bosques, nos rios, nos lagos, nas praias. Aí é onde Eu vivo e aí expresso o meu amor por ti.
Pára de me culpar da tua vida miserável: Eu nunca te disse que há algo mau em ti ou que eras um pecador, ou que a tua sexualidade fosse algo mau.
O sexo é um presente que Eu te dei e com o qual podes expressar o teu amor, o teu êxtase, a tua alegria. Assim, não me culpes por tudo o que te fizeram crer.
Pára de ler supostas escrituras sagradas que nada têm a ver comigo. Se não podes ler-me num amanhecer, numa paisagem, no olhar de teus amigos, nos olhos de teu filhinho... não me encontrarás em nenhum livro!
Confia em mim e deixa de me pedir. Tu vais-me dizer como eu devo fazer o meu trabalho?!
Pára de ter tanto medo de mim. Eu não te julgo, nem te critico, nem me irrito, nem te incomodo, nem te castigo. Eu sou puro amor.
Pára de me pedir perdão. Não há nada a perdoar. Se Eu te fiz... eu enchi-te de paixões, de limitações, de prazeres, de sentimentos, de necessidades, de incoerências, de livre-arbítrio. Como te posso culpar se respondes a algo que eu pus em ti? Como posso castigar-te por seres como és, se Eu sou quem te fez? Crês que eu poderia criar um lugar para queimar todos os meus filhos que não se comportem bem, pelo resto da eternidade?! Que tipo de Deus pode fazer isso?!
Esquece qualquer tipo de mandamento, qualquer tipo de lei; isso são artimanhas para te manipular, para te controlar, que só geram culpa em ti.
Respeita o teu próximo e não faças o que não queiras para ti. A única coisa que te peço é que prestes atenção à tua vida, que o teu estado de alerta seja o teu guia.
Esta vida não é uma prova, nem um degrau, nem um passo no caminho, nem um ensaio, nem um prelúdio para o paraíso. Esta vida é o único que há aqui e agora, e o único que precisas.
Eu fiz-te absolutamente livre. Não há prémios nem castigos. Não há pecados nem virtudes. Ninguém leva um cartaz. Ninguém leva um registo.
Tu és absolutamente livre para fazeres da tua vida um céu ou um inferno.
Não te poderia dizer se há algo depois desta vida, mas posso dar-te um conselho: Vive como se não houvesse. Como se esta fosse a tua única oportunidade de aproveitar, de amar, de existir. Assim, se não há nada, terás aproveitado da oportunidade que te dei.
E se houver, podes ter a certeza de que Eu não te vou perguntar se foste bem comportado ou não. Eu vou perguntar-te se tu gostaste, se te divertiste... do que mais gostaste? O que aprendeste?
Pára de crer em mim - crer é supor, adivinhar, imaginar. Eu não quero que acredites em mim. Quero que me sintas em ti. Quero que me sintas em ti quando beijas a tua amada, quando agasalhas a tua filhinha, quando acaricias o teu cachorro, quando tomas banho no mar.
Pára de louvar-me! Que tipo de Deus ególatra tu acreditas que Eu seja?
Aborrece-me que me louvem. Cansa-me que agradeçam. Tu sentes-te grato? Demonstra-o cuidando de ti, da tua saúde, das tuas relações, do mundo. Sentes-te observado, surpreendido? Expressa a tua alegria! Essa é a maneira de me louvares.
Pára de complicar as coisas e de repetir como papagaio o que te ensinaram sobre mim. A única certeza é que tu estás aqui, que estás vivo e que este mundo está cheio de maravilhas. Para que precisas de mais milagres? Para quê tantas explicações?
Não me procures fora! Não me acharás. Procura-me dentro... aí é que estou, a bater em ti."
Baruch de Espinosa
in «Ética demonstrada à maneira dos geómetras (Ethica Ordine Geometrico Demonstrata)»
"traduzido do Brasilês" por Paulo Moura

4 comentários:

  1. É isso. Desse jeito mesmo. Sem tirar, nem pôr.
    Por isso reforço que templos suntuosos, cobertos de ouro...camuflados de pregadores do Evangelho...nada mais são do que um engodo.
    Falar de Paz e Amor... fala-se até descalço, pelas calçadas e caminhos inóspitos da vida.
    (Bem traduzido).

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  2. O meu Deus é isso....
    Mas isso é apropriar-me de Deus e Deus não é meu, eu é que posso acreditar ou não ser dele.
    Se ele existir, então olhar-me á com um sorriso condescendente, ao ver-me tão senhor da sua existência depender da minha vontade.
    Se não existir, então inventarei uma dúvida acerca da sua existência, e então, Deus que não existe passará a ser exactamente metade de tudo o falta para aprender.

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