novembro 10, 2014

«Quando é o Estado a pagar...» - António Pimpão

O governo pretende privatizar os transportes públicos, sob a forma de concessão, em condições que não são ainda conhecidas.
António Costa, presidente do município de Lisboa, deseja que a exploração dos transportes públicos da capital (Carris e Metro) passem a ser explorados diretamente pelo próprio município.
O governo entende que, se o município de Lisboa se quiser habilitar à concessão dos referidos transportes públicos, o deve fazer competindo com os demais interessados.
Porém, António Costa defende que o estado deve continuar a suportar todos os encargos com a aquisição da atual frota (leasing), a pagar a sua manutenção e as infraestruturas e que continue a pagar os subsídios compensatórios relativos aos passes sociais (e presumo, cobertura dos prejuízos). Ou seja, mudam as moscas…
Tudo indica que o presidente do município de Lisboa o que quer é que seja a câmara a explorar os transportes na cidade, que possa lá empregar quem muito bem entender, normalmente protegidos ou correligionários, com preocupações centradas nos aspetos sociais, sem cuidar da eficiência; e que sejam os contribuintes nacionais – nós - a pagar a fatura. É uma forma conveniente de solidariedade.
Não consigo subscrever esta visão um tanto mítica e messiânica do estado, em que se considera que quando é o estado a pagar… ninguém paga. Ora, a verdade incontornável é que quando é o estado a pagar… todos pagamos.
Enquanto que, por um lado, como ocorre com as SCUT, se reclama a aplicação do princípio do utilizador pagador – com o qual concordo -, por outro não se deixa de puxar a brasa à sua sardinha e aliviar os munícipes locais e enviar para todos os contribuintes a fatura daquilo de que só alguns dispõem e consomem. E o que se passa com os transportes passa-se com muitos outros benefícios públicos, designadamente artes e espetáculos, em que a capital é o único local que deles dispõe… mas todos pagamos.
Esperava uma maior atenção ao interesse coletivo da parte de quem se propõe vir a governar o país.

António Pimpão

4 comentários:

  1. Bem.
    Vamos a factos.
    Em lugar nenhum do mundo os transportes públicos urbanos são rentáveis, ou seja, dão prejuizo.
    É um problema que emerge do modelo de crescimento dos centros urbanos que se desenvolveram tendo em conta a facilidade de transporte baseada no dado que se julgava eterno: o preço irrisório dos combustíveis
    Se, dado isto, terá sido rentável em algum momento do desenvolvimento? É possivel, mas à medida que as cidades se tornaram nos dados adquiridos de aglutinação de interesses que hoje são, tornaram-se cada vez mais reféns da necessidade absoluta de transporte de massas de carácter pendular e acessível.
    Fazer repercutir o preço real sobre os transportes públicos, pode fazer com que as grandes cidades se tornem simplesmente impossíveis de gerir.
    Por esse motivo eles são subsidiados, nunca se paga o preço real do transporte.
    Mesmo a empresa que menos prejuizo dá, a Toronto Transit Comition, tem receitas de 80%, necessita por isso que o Estado cubra os restantes 20, para que se obtenha o saldo 0, as contas equilibradas.

    O quadro seguinte dá uma pálida imagem:
    Companhia Paulista de Trens Metrapolitanos 507 milhões de R$ de prejuizo
    Em Nova York, uma quantidade de fundos e programas públicos colmatam as necessidades gigantescas nos custos de transportes que orçam 3000 milhões de dólares, não cobertos pelos bilhetes dos passageiros.
    Califórnia, 2300 milhões de dolares de orçamento, que dão prejuizo tapado em parte com taxas cobradas sobre os combustíveis, mas insuficientes para tapar o buraco: mais fundos públicas intervêm.
    E por todo o mundo é mais ou menos o mesmo filme.
    Isto não é obviamente saudável.
    Nenhum modelo de desenvolvimento deverá assentar em dívidas crescentes de um dos dados da equação.
    A não ser que se façam engenharias financeiras de forma a inscrever as vantagens de transportes baratos como investimentos na rendabilidade de um projecto maior que é uma cidade com as suas milhares de empresas, e aí, não é um prejuizo mas um custo operacional.
    Que deverá ser racionalizado, bem gerido, mas que ninguém tenha dúvidas, quando a "retoma chegar" se chegar e quando chegar, o aumento da necessidades de transporte colectivos irão aumentar os défices dessas empresas.
    Ou isso, ou reformular totalmente o nosso modelo de desenvolvimento económico em o emprego é uma vertente que pode dispensar um carro, mas nunca um metro, e / ou uma rede de autocarros urbanos.
    Quanto aos espectáculos....
    Viena de Austria é a cidade do mundo que mais salas de concerto e ópera possui em toda a Europa,
    No conjunto não dão um tostão de lucro, dão até prejuizo. Mas a entrada de divisas na economia da cidade que pela via dos concertos entra faz desse prejuizo o melhor e mais rentável investimento que os Vienenses poderiam ter. Restaurantes, Hoteis, empresas turísticas, toda a gente ganha dinheiro por causa de uma coisa onde afinal e falando apenas em contas, se perde...

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  2. Charlie, não é isso que está em causa. A questão é quem deve pagar esse défice.O país todo? As regiões que não beneficiam dessas infraestruturas?

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  3. Na organização dos Estados existe em tese uma coisa que se chama o princípio da solidariedade, todos pagam impostos para todos. Se uma região é defecitária num sector, se-lo á superavitária noutros, e em princípio todas as regiões tem algo com que contribuam liquidamente para as outras, entenda-se: impostos.
    A questão fundamental acho eu , é a da gestão. Quando as coisas são do Estado, uma determinada cultura que se instalou vê essas coisas com sendo "deles" em vez de serem vistas como "nossas".
    Assim, os prejuizos do Estado em sectores com saúde e transportes, não são prejuizos deles, mas sim nossos, saem dos nossos bolsos e muitas vezes devido à distorção de mentalidades e não só, subvertem todo o sentido inicial do que deve ser um serviço público: uma coisa de TODOS e não quintinhas onde meia dúzia de todo-poderosos pavoneam as suas importâncias e atiram os prejuizos para os Estados.
    E a gente tem visto como na verdade é assim.

    Mas devo dizer que embora não o tenha dito expressamente, concordo em pleno com o Pimpão. Não falo de Saúde pública e Ensino mas as regiões devem prover determinados tipos de despesas. Quando referi os casos de N.York e Califórnia ficou patente como são elas que criam os mecanismos locais para suportar os défices locais que são característicos e o transporte colectivo é paradigmático. Todos os fundos de suporte são locais, quer através de colocação de dívida (empurrar com a barriga) quer através da contribuição local com as taxas e impostos.
    Uma forma de fazer com que as coisas mudassem seria ter-se ido para a regionalização e aí cada região administraria determinado tipos de despesas, tal como no interior temos que pagar as Scuts que usamos, também os habitantes e usufrutuários quase exclusivos de determinados bens, deveriam ser eles também a contribuir mais. Sem deixar de ser solidário, entenda-se.

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  4. Charlie, o princípio da solidariedade é as regiões mais pobres financiarem as mais ricas?!

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