julho 17, 2014

O acordo plural – serviço público

É nisto que dá o facto – temível! – de grande parte da nossa abordagem à cultura ocorrer através da televisão, com ou sem cabo, quando, tantas e tantas vezes, o único cabo de que aqui se poderá falar é o cabo de esquadra…

Já agora e para quem não saiba, esta expressão «de cabo de esquadra» provém de um tempo, não muito remoto, em que o cabo de qualquer esquadra, como o elemento menos graduado que era, não primar pelos seus conhecimentos académicos; saber ler e escrever lhe bastava para o desempenho da função, pelo que a expressão, que ainda hoje muito se utiliza, provenha também dos disparates proferidos por quem, tendo autoridade, não tinha, entretanto, sapiência em adequada conformidade, fenómeno que, aliás, volta a registar-se com profusão.

Isto tudo porque não há reunião de amigos, profissional ou outra, programa de rádio ou de televisão onde, proferido até por gente de onde tanto abismo não se esperaria, o termo «acordo» no seu plural não seja pronunciado «acórdos»… No mínimo, pressente-se alguma hesitação, um ah-ah-ah… constrangido, mas lá se soltam os «acórdos», expelidos sem apelo mas muito agravo, permanecendo no ar um certo cheiro a enxofre e a animal morto.

Por mim, um pouco cioso e zeloso destas coisas ligadas à nossa querida Língua Portuguesa, encetei de há longos anos uma campanha em favor dos acordos, mas com a sua identidade própria, isto é, pronunciados «acôrdos». É pois nesta cruzada que volto à baila, respigando como auxiliares, mais duas dicas que apurei na net. Vejam lá:

Instituto Superior de Educação http://linguamodadoisec.blogspot.pt/2010/08/qual-o-plural-de-acordo-acordos-ou.html:
30 Agosto 2010
Qual o plural de acordo? Ac[ô]rdos ou Ac[ó]rdos?
O plural de acordo é ac[ô]rdos – com ô fechado.
E porquê?
Porque esta é uma palavra formada por derivação regressiva a partir do verbo acordar, cuja vogal o se pronuncia /u/.
Quando se formou a palavra acordo (já no século XIV), o som da vogal o passou a /ô/, por ter a vogal passado a pertencer à sílaba tónica. No plural, naturalmente, a vogal mantém-se fechada (/ô/): ac[ô]rdos.
A regra mantém-se, por conseguinte, para outras palavras: a vogal o da sílaba tónica das palavras terminadas em o formadas por derivação regressiva de outras cujo radical tinha esse som fechado pronuncia-se /ô/ e, como regra geral, mantém essa pronúncia no plural: adorno, adornos (de adornar), consolo, consolos (de consolar), encosto, encostos (de encostar), acordo, acordos (de acordar)!

Também no Ciberdúvidas da Língua Portuguesa (http://ciberduvidas.pt/pergunta.php?id=777)pode ler-se e confirmar-se:

/Acôrdo/, /acôrdos/
[Pergunta] Somos frequentemente confrontados, sobretudo nos noticiários televisivos e radiofónicos, com diferentes pronúncias do plural das palavras acordo (acôrdos; acórdos) e molho (môlhos; mólhos). Qual a «opção» correcta?
Paulo Luís de Castro :: :: Portugal
[Resposta] O plural de acordo (côr) é acordos (côr).
Em molho, temos duas palavras:
a) Molho (/môlhu/) a significar aquele líquido que se põe nas iguarias para lhes dar determinado sabor. O plural é /môlhos/.
b) Molho (mó) significando braçado, paveia: um molho de palha. O plural é /mólhos/.
José Neves Henriques :: 01/05/1997

Claro que ninguém pronuncia (ainda) «consólos» ou «encóstos» ou «adórnos», assim a modos como quem pronuncia «córnos»… mas, por razões que a razão e o saber desconhecem, o que há mais é opinadores a proferirem desbocadamente os malfadados «acórdos».

Se calhar, é por isso que a grande maioria dos «acórdos» não passa de letra morta…

8 comentários:

  1. A questão do timbre do e do são das mais complexas que atingem o vocalismo no Português Europeu. É que, quando as pessoas não sabem a etimologia, gera-se uma confusão irresolúvel. O plural de n(ô)vo, por exemplo, é n(ó)vos. E porquê? Porque o caso etimológico (o acusativo latino) tinha terminações diferentes no singular e no plural. Ao singular NOVUS corresponde o plural NOVOS, sendo ambos, em latim, pronunciados com aberto na vogal do radical. Por efeito da metafonia, o -U final do singular vai fechar em um grau o timbre da vogal rizotónica (a última vogal tónica do radical, neste caso NOV-). Por isso o /ó/ do étimo fecha para /ô/ na palavra portuguesa. No plural isso não acontece porque a vogal do tema é um bem aberto (pronunciava-se /nóvós/). Mas depopis apareceu o lobo e papou tudo o que se disse. Brincadeira, porque não é verdade: no caso de 'novo' e 'lobo' há diferença de timbre no plural também por causa da etimologia e exatamente do mesmo fenómenos, a metafonia vocálica: NOVOS versus LUPOS, em que a vogal radical era -U- e por isso ametafonia foi em sentido inverso: houve abertura de um grau de /u/para /ô/. Como se vê, tudo se explica, o problema é o acesso a este nível de informação que o atual português médio não tem, e é pena.

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    1. Somos uns bons pôvos, quando comemos ôvos.

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    2. Este comentário foi removido pelo autor.

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    3. Na minha explanação há uma incorreção. O acusativo singulara de NOVUS e LUPUS são NOVUM e LUPUM, respetivamente, pelo que deveriam ser estas formas a constar e não os nominativos que lá coloquei....

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    4. Bem me queria parecer

      ahahahahahahahahah

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  2. A gente vê e ouve com cada desgraça, ele é nas legendas corre-corre em rodapé, ele é gente da comunicação a botar faladura, que até mete dó...
    Caso para dizer que os disparates caiam que nem tôrdos,,, :)

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  3. Isso é briga de TITÃS.
    Nem ouso me meter.

    :-/

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