janeiro 24, 2014

«Pai pode ser mãe?» - António Pimpão

Confesso não estar muito por dentro da problemática que envolve a questão da co-adoção. Por isso, o que se segue pode conter algumas ingenuidades e revelar alguma ignorância, o que, a acontecer, espero me seja relevado.
Não obstante o que acabo de referir, creio que isso não me pode inibir de registar e partilhar algumas dúvidas, algumas interrogações.
Pelo que entendo, o que está em causa é a possibilidade de, no âmbito de uma relação matrimonial surgida entre duas pessoas do mesmo sexo (para simplificar, vamos admitir que se trata de dois homens; no entanto, vale, mutatis mutandis, para uma relação entre duas mulheres), o filho que um deles tenha trazido de uma anterior relação heterossexual poder ser adotado pelo atual parceiro do pai.
Não me parece que, à partida, isso seja condenável. Mas já não sou da mesma opinião quando o momento da análise passar para um período posterior.
Com efeito, se o casal homossexual se mantiver unido para toda a vida, não me parece que possa vir mal ao mundo por a criança ser educada num ambiente que muitos consideram não natural, embora creio que escasseiam estudos que dêem segurança ao assunto.
Mas, o que se passará se - como acontece cada vez com mais frequência nos casais heterossexuais - os dois se separarem e o pai biológico da criança se voltar a “casar” com outro homem ou, até, com outra mulher? Ou, pior, se morrer o pai biológico da criança?
Segundo o meu entendimento, a lei que está em discussão pretende resolver a situação em que se encontra atualmente o “casal” com um filho de um deles, conferindo a paternidade da criança ao companheiro do pai biológico, tornando-se esta definitiva. Ou seja, a criança nunca mais poderá ter novo segundo pai ou uma segunda mãe adotivos, no caso de o pai biológico se voltar a “casar”. É que não é possível ter mais que dois progenitores legais e, mesmo em caso de “divórcio”, o pai com força legal não perde – não pode perder - essa condição.
Aparentemente, volta tudo à estaca zero, ou seja, à situação que vigorava quando esta lei não existia. Com uma diferença: entretanto criou-se um pai que, depois, deixou de o ser na prática mas que continua a sê-lo legalmente. Tendo-se zangado com o pai biológico, não me parece que queira mais saber do "filho".
Ainda nessa hipótese do divórcio, será que o pai não biológico divorciado – porque é pai legal – poderia reclamar o direito a passar os fins de semana com a criança, apesar de esta ter deixado de ter qualquer relação com ele?
E se o pai biológico voltasse a casar com uma mulher e ele entretanto morresse, quem mantinha o direito a ficar com a criança? O mais provável é que fosse o pai legal, de quem o pai biológico até se tinha afastado, e, não, a companheira com quem a criança e o seu pai tinham passado a viver! Faz algum sentido?
Se as coisas forem assim, o que está a ser reivindicado resolve o problema da relação atual entre duas pessoas do mesmo sexo mas não resolve, antes complica, qualquer acidente de percurso do tipo dos enunciados. Não será?!

António Pimpão

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