agosto 13, 2012

A posta na aceleração perigosa de uma economia sem travões


A globalização, uma realidade aparentemente imparável, parece possuir uma característica que se destaca das demais e certamente fará as delícias de organizações e de pessoas poderosas em todo o Mundo: funciona como um gigantesco acelerador de todo o sistema capitalista, impondo ritmos de crescimento tão avassaladores que mesmo empresas de dimensão colossal acabam absorvidas pelas mega-corporações que funcionam quase como uma praga de eucaliptos nos seus nichos de mercado, gerando uma dinâmica que se pode definir como survival of the biggest.

O impacto deste fenómeno à escala global, cuja vertente mediática se cifra nas fusões ou assimilações de gigantes multinacionais, poderá estar na origem de dois conceitos, chamemos-lhes assim, que fazem escola há um par de décadas nas empresas de maior dimensão: na área comercial temos a escalada sistemática dos objectivos anuais e no sector produtivo impõem-se tempos-padrão para o completar de determinadas tarefas.
Em termos práticos, os directores comerciais vêem-se obrigados a desenharem objectivos cada vez mais altos e os seus congéneres da produção esforçam-se por conseguir que as suas unidades obtenham os melhores desempenhos em fracções de tempo cada vez mais curtas.
Isto parece lógico, razoável até.

Contudo, a realidade prática, a verdade dos factos por detrás do aparente (e seguramente temporário) sucesso desta combinação de automatismos (só as máquinas podem calibrar-se dessa forma) é o culto da frustração imposto aos comerciais que nunca chegam perto da cenoura pré-definida e da falta de brio aos técnicos a quem impõem ritmos impossíveis de abraçar sem perda da qualidade do serviço prestado. E entretanto a pressão vai dando cabo de quem trabalha, adicionada à do medo do despedimento que verga a coluna mesmo aos mais contestatários.
A realidade apresenta-se como a de um processo descontrolado, caótico, que está a definhar à mercê da sua inviabilidade, da sua falta de sintonia com um elemento fundamental da engrenagem: as pessoas.

Desde o início, a globalização soou-me, como a imensos economistas e outros estudiosos da dinâmica da coisa, ameaçadora. De resto, não faltam na Ficção Científica os hipotéticos cenários que o futuro pode criar a partir da tendência acelerada de canibalização de empresas por parte da sua concorrência de maior dimensão, com as regras de mercado a privilegiarem os impérios com pés de barro mas cuja voracidade acaba por trucidar tudo à sua passagem, pessoas e valores, sem hesitar em destruir-se enquanto sistema se a operação for lucrativa para os que mais interessam e que ninguém sabe muito bem quem são mas mandam cada vez mais no Mundo.
A crise provoca na globalização um fenómeno semelhante ao de um animal ferido que cego pela dor desfere golpes a quem se aproxima demais, ainda que venha em seu auxílio.
Na cegueira dos gráficos, das cotações, do lucro astronómico exigido a quem tem o seu dinheiro investido nessa máquina infernal, vale tudo para manter o tal ritmo alucinante que está a criar distorções e a pressionar decisores a arriscarem todo o tipo de golpadas, the show must go on, para cada ano representar um xis por cento de crescimento como deve ser.

Estão a ser cometidas asneiras com consequências irreparáveis, pelo menos no contexto do sistema capitalista como o conhecemos, com a agravante de ninguém saber o melhor passo a dar a seguir. Cada cabeça sua sentença, mesmo entre os entendidos, com o planeta em suspenso à espera de ver cair o primeiro dos gigantes que vacilam perante uma crise cada vez mais espalhada por contágio a cavalo na tal globalização que também colabora na infecção generalizada de países ou mesmo de continentes nesta orgia de milhares de milhões que se perdem em todo o lado e ninguém parece ser ganhador excepto umas figuras difusas, sinistras, especuladores ou coisa que o valha, e o sistema parece cada vez mais próximo do fim por quanto tentem chutar para canto o espectro de um armagedão financeiro que pode mesmo arrasar a sociedade como até agora a construímos.

E nos equilíbrios de forças nivelados por baixo, à escala global acelerada demais, basta uma pequena faísca para queimar o rastilho curto que nos separa de uma implosão como nem a Grande Depressão, mais localizada e sem tantas repercussões externas, representou.

10 comentários:

  1. Foi precisamente por ter sido considerado "benchmarking" o paradigma do crescimento geométrico que tanto em 1929 como agora se inventaram aquilo que eufemisticamente chamam de produtos tóxicos. Perante um universo físico limitado, não se pode extrapolar valores para além do seu quantitativo absoluto; não se pode tirar 20 litros de água de um tanque de 10. Mas, podemos dizer que dentro de determinado espaço de tempo, a chuva trará mais e assim criar expectativas de tiragens futuras. Ora é exactamtente neste intangível da expectativa que se criam dimensões absolutamente fantásticas e irrealistas se observadas a partir da normal racionalidade. O tal tanque de água poderá dar ao longo de uma vida humana milhares de vezes o seu volume absoluto, não se poderá dizer contudo que esses milhares de vezes sejam possíveis de obter em duas semanas, mas é precisamente isso, essa expectativa que materializa em titulos e se vende como um "produto", uma "boa prática" que todos os gestores devem seguir. Todos sabemos, estamos carecas de saber que existe um limite da capacidade de consumo individual, não é possivel projectar indefinidamente os crescimentos das actividades económicas. Muitas vezes, aponta-se como sendo uma crise o mero fenómeno de estabilização, o equilibrio entre a oferta e a procura de um determinado bem. Em vez de se considerar que a empresa produtora está assim de boa saúde, diz-se que está ou vai entrar em crise. Assim, para projectar o seu crescimento, endivida-se, cria patromónio virtual na expectativa do património físico vindouro. Mas se todos fazem o mesmo, de que mercado futuro estão a falar? Quando na tv alguém diz que fez do desemprego uma oportunidade e começou a plantar coentros e cenouras e que as vende com sucesso, teria sucesso igual se todos os desempregados do país desatassem a plantar cencouras e coentros?
    A canabalização das mega empresas é um fenómeno que já no sec XVIII estava teorizada: a concorrência mata a concorrência e conduz ao monopólio. Assim, na esteira e confirmando a teoria, olhemos para a nossa Quinta do Lago: os ricos foram substituidos pelos super-ricos...
    Quem põe mão nisto?
    Com os Estados reféns das teorias liberais, desprovidos de meios próprios e subjugados ao espartilho do poder económico, é muito complicado, A nâo ser que se empurre uma cadeira qualquer e uns supres ricaços caiam ao chão...
    (desde que não seja na quinta do lago, para não espantar os gajos do capital...atrevo-em a ler em voz alta os pensamentos do coelhos e gaspares deste mundo)

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    1. Quando estudei os mercados de futuros, pensei para comigo: "esta merda presta-se a muita... merda!"

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  2. Os mercados de futuros.
    Uma bela definição.
    Vender hoje a semente pelo preço dos frutos que ela irá produzir algures- hipotetica ou presumivelmente- nesse futuro. Tal como a dúzia de ovos cozidos que no tempo da miséria, o emigrante a caminho dos Estados Unidos adquiriu a um amigo para reforço alimentar durante a viagem no fundo do porão do navio. Quando anos depois, já abonado e bem na vida, regressou, foi agradecer ao amigo, e pagar-lhe o favor, pois com as pressas de embarque a tal dúzia de ovos tinha ficado de calote.
    O amigo não aceitou. Nâo porque era amigo e afinal uma dúzia de ovos é coisa irrisória perante uma amizade, mas porque queria muito mais dinheiro, mas mesmo muito mais dinheiro. Argumentava que um dúzia de ovos, poderiam ter dado origem a uma dúzia de galinhas, as quais poriam muitas centenas de dúzias de ovos que por sua vez dariam novas galinhas e assim em dez anos, ele teria ficado beneficiado pelo produto de milhares de galinhas e tudo a partir da dúzia que tinha ficado em dívida.
    Apresentou a conta: uma coisa descomunal que obviamente o emigrante não pagou pelo que o diferendo foi a tribunal. Uma vez diante do Juiz, o credor da dúzia de ovos explanou as suas razões, após o que o magistrado se voltou para o devedor e perguntou o que tinha a alegar em sua defesa.
    - Nada, senhor doutor juiz, tudo o que ele diz está correcto pelo que peço que faça justiça, mas suplico que o faça com celeridade, pois deixei dois quilos e meio de bagos de milho ao lume e queria ver se os ia semear ainda antes do almoço....

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    1. ihihihihih
      As coisas que tu sabes do mercado de futuros :O)

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    2. O futuro é um c...;)...

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    3. Quando é usado para especular, é um grande c...

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  3. No fundo, joga-se com a ilusão que todos temos da nossa eternidade.
    Quer para a especulação quer para o aperto do cinto: no futuro fica sempre o amanhã que canta. Investe hoje que amanhã lucras, aperta o cinto que logo virá a folga, quando no fundo, a vidinha se esgota a cada segundo que se vive, e nunca mais regressa.

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    1. Em teoria, os futuros (mercado de derivados) são algo que parece tecnicamente razoável e lógico. Mas...

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    2. ...Mas só em teoria todos os players jogam limpo.

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